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A juventude de hoje
Em conversa com o irmão mais novo de um amigo, cheguei a uma triste
conclusão.
A juventude de hoje, na faixa que vai até aos 20 anos, está perdida.
E está perdida porque não conhece os grandes valores que orientaram os que hoje rondam os trinta.
O grande choque, entre outros nessa conversa, foi quando lhe falei no Tom Sawyer. "Quem? " , perguntou ele. Quem?! Ele não sabe quem é o Tom Sawyer! Meu Deus...
Como é que ele consegue viver com ele mesmo? A própria música: " Tu que andas sempre descalço, Tom Sawyer, junto ao rio a passear, Tom Sawyer, mil
amigos deixarás, aqui e além... " era para ele como o hino senegalês
cantado em mandarim.
Claro que depois dessa surpresa, ocorreu-me que provavelmente ele não
conhece outros Ãcones da juventude de outrora.
O D'Artacão, esse herói canÃdeo, que estava apaixonado por uma caniche;
Sebastien et le Soleil, combatendo os terrÃveis Olmecs;
Galáctica, que acalentava os sonhos dos jovens, com as suas naves
triangulares;
O Automan, com o seu Lamborghini que dava curvas a noventa graus;
O mÃtico Homem da Atlântida, com o Patrick Duffy e as suas membranas no
meio dos dedos;
A Super-Mulher, heroÃna que nos prendia à televisão só para a ver mudar de
roupa (era às voltas, lembram-se?);
O Barco do Amor, que apesar de agora reposto na Sic Radical, não é a mesma coisa.
Naquela altura era actual ...
E para acabar a lista, a mais clássica de todas as séries, e que marcou mais gente numa só geração: O Verão Azul.
Ora bem, quem não conhece o Verão Azul merece morrer. Quem não chorou com a morte do velho Shanquete, não merece o ar que respira. Quem, meu Deus, não sabe assobiar a música do genérico, não anda cá a fazer nada.
Depois há toda uma série de situações pelas quais estes jovens não
passaram, o que os torna fracos. Ele nunca subiu a uma árvore! E pior,
nunca caiu de uma. É um mole. Ele não viveu a sua infância a sonhar que um
dia ia ser duplo de cinema. Ele não se transformava num super-herói quando
brincava com os amigos. Ele não fazia guerras de cartuchos, com os canudos
que roubávamos nas obras e que depois personalizávamos. Aliás, para ele é
inconcebÃvel que se vá a uma obra.
Ele nunca roubou chocolates no Pingo-Doce.
O Bate-pé para ele é marcar o ritmo de uma canção.
Confesso, senti-me velho ...
Esta juventude de hoje está a crescer à frente de um computador.
Tudo bem, por mim estão na boa, mas é que se houver uma situação de perigo real, em que tenham de fugir de algum sÃtio ou de alguma catástrofe, eles vão ficar à toa, à procura do comando da Playstation e a gritar pela Lara
Croft. Óbvio, nunca caÃram quando eram mais novos. Nunca fizeram feridas,
nunca andaram a fazer corridas de bicicleta uns contra os outros.
Hoje, se um miúdo cai, está pelo menos dois dias no hospital, a levar
pontos e a fazer exames a possÃveis infecções, e depois está dois meses em
casa a fazer tratamento a uma doença que lhe descobriram por ter caÃdo.
Doenças com nomes tipo " " , que não existiam antigamente.
No meu tempo, se um gajo dava um malho (muitas vezes chamado de "terno") nem via se havia sangue, e se houvesse, não era nada que um bocado de
terra espalhada por cima não estancasse.
Eu hoje já nem vejo as mães virem à rua buscar os putos pelas orelhas,
porque eles estavam a jogar à bola com os ténis novos.
Um gajo na altura aprendia a viver com o perigo.
Havia uma hipótese real de se entrar na droga, de se engravidar uma miúda
com 14 anos, de apanharmos tétano num prego enferrujado, de se ser raptado quando se apanhava boleia para ir para a praia. E sabÃamos viver com isso.
Não estamos cá?
Não somos até a geração que possivelmente atinge objectivos maiores com
menos idade?
E ainda nos chamavam geração "rasca"...
Nós éramos mais a geração "à rasca", isso sim.
Sempre à rasca de dinheiro, sempre à rasca para passar de ano, sempre Ã
rasca para entrar na universidade, sempre à rasca a ver se a namorada
estava grávida, sempre à rasca para tirar a carta, para o pai emprestar o
carro. Agora não falta nada aos putos.
Eu, para ter um mÃsero Spectrum 48K, tive que pedir à famÃlia toda para se
juntar e para servir de prenda de anos e Natal, tudo junto.
Hoje, ele é Playstation, PC, telemóvel, portátil, Gameboy, tudo. Claro,
pede-se a um chavalo de 14 anos para dar uma volta de bicicleta e ele
pergunta onde é que se mete a moeda, ou quantos bytes de RAM tem aquela
versão da bicicleta.
Com tanta protecção que se quis dar à juventude de hoje, só se conseguiu
que 8 em cada dez putos sejam cromos.
Antes, só havia um cromo por turma. Era o tóto de óculos, que levava
porrada de todos, que não podia jogar à bola e que não tinha namoradas. É
certo que depois veio a ser lÃder de algum partido, ou gerente de alguma
empresa de computadores, mas não curtiu nada.
Hoje, se um puto é normal, ou seja, não tem óculos, nem aparelho nos
dentes, as miúdas andam atrás dele, anda de bicicleta e fica na rua até à s
dez da noite, os outros são proibidos de se dar com ele.
Nuno Markl
Posted by: cafajeste / 5:22 AM
Postado por Kuska * 11:46
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